domingo, 1 de agosto de 2010

.amazing grace

Foto: Hugo Moura

Amanheceu cedo depois do tardio anoitecer. Foi então clara a óbvia e significativa diferença entre o primeiro amanhecer delas e o meu terceiro amanhecer. A euforia histérica e sufocante destas crianças pela dimensão da bênção que é uma semana fora de casa traz-me um sorriso que me incapacita para a repreensão.
- Meninas, amanhã fazemos assim. Se vocês acordarem antes de nós (especialmente, se vocês acordarem antes do nascer do Sol), não façam barulho, para que o resto das pessoas na tenda possam dormir mais um pouco.
E é assim que começa o dia, bem antes do planeado. Sem tempo para ocultar sob uma considerável camada de base as olheiras com que até eu me assusto, enfrento o mundo quase corajosamente após um rápido banho de água fria. A vida corre, acelerada, atropelando cada segundo desta terça-feira. Acordar as crianças, contar se estão todas presentes,  servir as refeições, limpar o refeitório, ouvir e acompanhar as histórias de vida mais aterradoras, vidas que já viveram mais do que deviam, muito mais do que deviam. Vidas de 6 anos que já viveram e experienciaram mais que a maioria das vidas adultas. Com alguns líderes fora em compromissos e um teatro para preparar, deixamos as crianças quase por sua conta durante um pequeno espaço de tempo em que muitas coisas correm mal, sob a nossa responsabilidade. Chega a ponderar-se o cancelamento do teatro pelo avançado da hora, e acabamos a decidir que o teatro tem que ser apresentado.
É então que um grupo física e emocionalmente esgotado entra no auditório e se põe em posição para representar a história de 6 vidas que tanto tocaria cada pessoa que assistiu e cada pessoa que participou. Ainda antes de as crianças entrarem, de uma voz tão doce e familiar, 'Por Teu grande amor, a luz e o calor, queremos Senhor dar-Te graças, também pelo pão, pela habitação, de bom coração damos graças. Louvamos-Te, oh Deus.' Espontânea e automaticamente, todos nós começamos a cantar, em diferentes vozes, toda a harmonia do único meio de comunicação permitido naquele momento para fazer a ligação entre nós e Deus: a música, o louvor. Quando as crianças começam a entrar, passamos da letra para 'ooooohh's', continuando a entoar a mesma melodia, saída directamente de corações humildes, quebrantados e preparados para servir. As crianças continuam a entrar e nós passamos para 'Amazing Grace', inicialmente com letra, depois sem letra, a vozes, deixando cada criança e jovem perplexa e sem reacção. Começamos então o teatro, tocando e proporcionando mudanças em vidas destroçadas, preparados para seguir a nossa tarefa até ao fim, servindo aquelas crianças em cada segundo daquela semana.
'Deus escreve direito por linhas tortas.' A ligação directa com Ele não foi facilitada, não da forma convencional, mas foi estabelecida, de outra forma, com a união do que fomos e somos enquanto grupo. Oro para que este grupo continue a ultrapassar as barreiras e limites do convencional, mantendo contacto, confiança, partilha, serviço, propósito, juntos. O que nos move? O Deus do impossível, a única esperança tanto para nós como para as crianças com quem trabalhamos.

Dedicado à equipa de líderes e às crianças e jovens do ACJ2010.

domingo, 18 de julho de 2010

.antes

Vozes, gargalhadas, amigos, jogos, sandes, óculos escuros, pulseiras, água fresca, bolas de berlim, areia, mar, uma vida, e eu. Hoje a vida passa-me ao lado. Mantenho-me séria, embrenhada em pensamentos longínquos que me afastam mais e mais da realidade, mais e mais do mundo, e aproximam mais e mais de Ti. Hoje tenho prazer na Tua presença, no Teu conforto, no Teu cuidado, apesar de tudo o que me rodeia. Sei que Tu cuidas de mim, e escolho confiar. Seja como Tu quiseres.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

[dois]

Hoje fica um esboço de sorriso pelo que outrora foi e se foi, de modo a que hoje já não é. Alguém sábio chamou-lhe um dia recordação.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

.o grito

Foto: Hugo Moura

Hoje tudo se resume a um grito.

Até há bem pouco tempo, este seria um momento de nervos, flexibilidade, laca, exercício, brilhantes, músculos doridos, maillot, lantejoulas, maquilhagem, aperto no estômago, treinar e repetir vezes sem conta as partes mais difíceis, repetir o exercício mentalmente, cumprir à risca o aquecimento, como nunca, vendo a flexibilidade aumentar a olhos vistos, e ultrapassar barreiras nunca outrora ultrapassadas, metas nunca antes superadas, não em treinos. Hoje, agora, seria o momento de fazer justiça à expressão 'dei o meu melhor'. Seria o momento de dar tudo de mim, deixar metade do que sou no praticável, fazer valer naqueles 3 minutos o investimento de horas e horas de trabalho. Realmente, foi isso que aconteceu na última vez que estive nesta situação. Foi exactamente isso. Dei tudo, tudo o que tinha e um bocado do que não tinha, e por isso, hoje, tudo se resume a um grito. Assim, hoje acompanho, observo, encorajo, desenho.

Chego cedo e trabalho em preparativos, falo com as treinadoras, dedico-me à minha tarefa, e elas começam a chegar. E aquele cheiro... aquele doce cheiro a ginástica, cuja doçura só percebo agora, que não faço parte do calendário. Respiro-o, sentido a laca, normalmente indesejada, hoje perfeita. Vejo-as aquecer, superar barreiras, treinar o exercício, repetir o que é mais difícil, mudar de roupa, maquilhar, e tudo começa. No irónico papel de locução, apresento as minhas colegas que avançam para mostrar o que valem. No fim, como sempre, o nosso grito. Chego ao praticável num voo desde o meu lugar e grito. Sim, ainda tenho um lugar aqui. Enquanto puder, sou e serei ginasta. Porque ali, na família que é aquela equipa, no abraço que é aquele grito, eu sei quem sou. Não vejo a hora de ter a lesão resolvida e estar ali, a gritar, com maillot, brilhantes, o cabelo cheio da abençoada laca, e o nervoso miudinho característico daquele contexto. Para que na próxima vez não seja só um grito. Porque por grandioso que seja, não é suficiente. Ainda não.

Para ti, minha fiel amiga.
Que estejamos as duas devidamente equipadas para o próximo grito.

domingo, 20 de junho de 2010

.foco

Estou na entrada do Palácio Anjos, à espera de uma preciosa e fiel amiga para um café. À minha esquerda tenho a entrada principal, o terminal dos autocarros, a estação do comboio, o terminal do eléctrico, a bomba de gasolina, fumo, buzinas, travagens bruscas, gritos, posso ouvir e cheirar toda a poluição. À minha direita tenho o palácio, o jardim, a esplanada, os pássaros, as famílias que aproveitam o sol tímido que podemos ver, reflectido em cada centímetro deste espaço, os velhotes que jogam cartas, posso ouvir e cheirar toda a natureza. Tenho duas realidades opostas que se encontram e confrontam exactamente no ponto onde eu estou. E eu estou a admirar a natureza. O barulho na estrada é muito maior, a agitação é completamente inquietante, mas eu hoje, aqui e agora, escolho maravilhar-me com a natureza. O que faz de mim o que sou não é o que me rodeia, mas a minha decisão de focar na estrada ou no jardim. E hoje, estrada, desafio-te. Venham acidentes, trânsito, buzinas, eu não tenciono sequer olhar. Hoje o jardim é meu, os pássaros vieram cantar, para mim, Deus está aqui, e eu quero ouvi-Lo.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

.salmo 30.5

16.Junho.2010
     Hoje escrevo a preto. A ausência de cor com a confusão das emoções que ocupam o meu pequeno corpo (aparentemente, demasiado pequeno para tudo isto) só é descritível em preto. Tudo isto ocupa demasiado espaço, não deixando espaço livre para os meus órgãos, que se debatem e apertam uns contra os outros e, numa luta constante, rejeitam a comida e impedem-me de dormir, sufocando cada inspiração e forçando a saída do pouco ar que me resta. O meu cérebro, como que atingido por um tornado, empurra-se contra o crânio e tenta saír, por algum lado, causando dores capazes de enlouquecer qualquer um. Todo o meu corpo dói, muito. 'O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.' ... a ver vamos.

17.Junho.2010
     Não é certamente esta manhã. O Sol já vai alto e a alegria ainda não chegou. Hoje também escrevo a preto.

terça-feira, 15 de junho de 2010

.sobre as águas

Insististe para que avançasse sozinha, irias lá ter
Na altura não percebi o motivo, confesso.
Tive que ultrapassar obstáculos, sem experiência nem saber
Pensei que me tinhas esquecido, que já não me irias proteger
Faz a Tua vontade em mim mas não me abandones, é só o que peço.
Conquistando os meus sentidos, o medo invade cada parte de mim
Respiro-o e dou-lhe as boas vindas, numa bebedeira de pavor
Já não penso com clareza e sinto que foi tudo longe demais
Ainda assim, brindo ao anunciar de um possível fim
E bebo, de um trago, ensaiando meia dúzia de palavras finais
Se não resolver nada, pelo menos alivia esta dor.
Afectada pela tempestade, tento não atingir nenhum rochedo
E é nisto que Tu chegas, sobre as águas, inesperado.
Sabia que virias, mas a forma da Tua chegada era ainda um segredo
E eu, sem Te reconhecer, tenho (tanto) medo
Até que Te revelas, e chega a ser ridículo o meu olhar assustado
Com a Tua identidade, a minha falta de fé é revelada
Porque Tu cuidas, e Tu sabes, e eu não avancei 'sozinha'.
Ao contrário do que pensei, não era a única na estrada
Posso agora ver em cada situação a Tua pegada
Grande, firme, sempre junto à minha.
A Tua grandeza é tão única que fascina
E eu desejo juntar-me a Ti e experimentar esse poder
Deixas-me avançar, supero o vento que o meu sonho desafina
Já sobre as águas e vendo as ondas, chega uma dúvida clandestina
Que rouba a aparente fé que eu até aí conseguira manter.
O que temia torna-se real, e sou arrastada para o fundo
Sufocada por circunstâncias, acabo submersa no vastíssimo mar
Eu sabia (e sei) que na palma da Tua mão está o mundo
E avancei confiante, até duvidar. uma fracção de segundo.
E foi esta dúvida (não a tempestade) que acabou por me afogar.
O meu futuro não depende do que me rodeia
Não está assente em vitórias ou em mágoas
Cada um colhe o que semeia
Perdoa-me, Pai, é nisso que este poema se baseia,
Porque ainda não tive fé suficiente para andar sobre as águas.


Mateus 14.22-33 'Jesus anda sobre as águas'
      22Logo em seguida obrigou os seus discípulos a entrar no barco, e passar adiante dele para o outro lado, enquanto ele despedia as multidões.  23Tendo-as despedido, subiu ao monte para orar à parte. Ao anoitecer, estava ali sozinho.  24Entrementes, o barco já estava a muitos estádios da terra, açoitado pelas ondas; porque o vento era contrário.  25À quarta vigília da noite, foi Jesus ter com eles, andando sobre o mar.  26Os discípulos, porém, ao vê-lo andando sobre o mar, assustaram-se e disseram: É um fantasma. E gritaram de medo.  27Jesus, porém, imediatamente lhes falou, dizendo: Tende ânimo; sou eu; não temais.  28Respondeu-lhe Pedro: Senhor! se és tu, manda-me ir ter contigo sobre as águas.  29Disse-lhe ele: Vem. Pedro, descendo do barco, e andando sobre as águas, foi ao encontro de Jesus.  30Mas, sentindo o vento, teve medo; e, começando a submergir, clamou: Senhor, salva-me.  31Imediatamente estendeu Jesus a mão, segurou-o, e disse-lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste?  32E logo que subiram para o barco, o vento cessou.  33Então os que estavam no barco adoraram-no, dizendo: Verdadeiramente tu és Filho de Deus.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

.luz ao fundo do túnel

A minha equipa nem sempre vence
O dia-a-dia não corre como planeado
Quero um estilo de vida que me recompense
‘Pai, dá-me a parte da herança que me pertence
Para poder fazer tudo o que não fiz no passado.’
Recebi, assim, tudo, antecipadamente.
E parti para um pais distante
Gastei tudo numa insensatez adolescente
Desperdicei cada cêntimo, agindo de cabeça quente
E tive que sobreviver sozinha nesta guerra constante
Com trabalho acrescido supria as necessidades
Vivia (se isso é viver) com um esforço desnecessário
Lembrei-me da protecção do Pai em todas as dificuldades
Melhor seria voltar e ser serva, protegida nas adversidades
Do que ficar longe sem nada e sozinha contra o adversário.
Eu ainda vinha longe, quando o Pai me reconheceu
É tão ridículo pensar que duvidei da Sua soberania
Como filha e não como serva, de braços abertos me recebeu
Preparou uma festa, a minha ansiedade desapareceu
‘Bem-vinda a casa’, era só o que eu ouvia
Sem palavras para agradecer, aprendi a lição
A vida não é fácil, cada um carrega a sua cruz
Os sorrisos dos que me amam trouxeram o perdão
Aos pés da Sua cruz relembrei a salvação
Olhando para o fundo do túnel, consegui ver a luz.


Lucas 15.11-32 'O Filho Pródigo'
     11Disse-lhe mais: Certo homem tinha dois filhos.   12O mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte dos bens que me toca. Repartiu-lhes, pois, os seus haveres.   13Poucos dias depois, o filho mais moço ajuntando tudo, partiu para um país distante, e ali desperdiçou os seus bens, vivendo dissolutamente.   14E, havendo ele dissipado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a passar necessidades.   15Então foi encontrar-se a um dos cidadãos daquele país, o qual o mandou para os seus campos a apascentar porcos.   16E desejava encher o estômago com as alfarrobas que os porcos comiam; e ninguém lhe dava nada.   17Caindo, porém, em si, disse: Quantos empregados de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome!   18Levantar-me-ei, irei ter com meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e diante de ti;   19já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus empregados.   20Levantou-se, pois, e foi para seu pai. Estando ele ainda longe, seu pai o viu, encheu-se de compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou.   21Disse-lhe o filho: Pai, pequei conta o céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho.   22Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa, e vesti-lha, e ponde-lhe um anel no dedo e alparcas nos pés;   23trazei também o bezerro, cevado e matai-o; comamos, e regozijemo-nos,   24porque este meu filho estava morto, e reviveu; tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a regozijar-se.   25Ora, o seu filho mais velho estava no campo; e quando voltava, ao aproximar-se de casa, ouviu a música e as danças;   26e chegando um dos servos, perguntou-lhe que era aquilo.   27Respondeu-lhe este: Chegou teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são e salvo.   28Mas ele se indignou e não queria entrar. Saiu então o pai e instava com ele.   29Ele, porém, respondeu ao pai: Eis que há tantos anos te sirvo, e nunca transgredi um mandamento teu; contudo nunca me deste um cabrito para eu me regozijar com os meus amigos;   30vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado.   31Replicou-lhe o pai: Filho, tu sempre estás comigo, e tudo o que é meu é teu;   32era justo, porém, regozijarmo-nos e alegramo-nos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu; tinha-se perdido, e foi achado.

Estou de volta a casa. Obrigada, Amiga.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

.estação de serviço

A viagem é longa, muito longa.
E eu quero (tanto) chegar ao fim
Vamos, acelera, sem paragens.
Chegar lá é importante para mim
Não vamos perder tempo com palavrinhas de cetim
Não há oásis, isso são miragens,
Não há tempo para ver paisagens
Não chegamos lá hoje, se continuamos assim.
A viagem é longa, muito longa.
E torna-se cada vez mais cansativa
Confirmo que o condutor ainda não adormeceu
Tento manter uma atitude positiva
Mas estou cansada e o sono não incentiva
"Pessoal, devíamos parar." (isso sei eu!)
"Temos que abastecer e este carro nem sequer é meu."
A viagem é longa, muito longa.
Chegamos, finalmente, a um consenso
E abandonamos temporariamente a estrada
Precisamos de descansar, é um percurso intenso
Até foi bom parar, agora que penso,
Descansar e abastecer para continuar a jornada
Em vez de arriscar ir pela saída errada
Ou ter um acidente, e isso eu dispenso.
Com um cansaço que já não venço
Paramos na estação de serviço e admito, estou cansada.
A viagem é longa, demasiado longa
Para ser feita de forma descuidada.


"Esperei com paciência no Senhor, e Ele se inclinou para mim, e ouviu o meu clamor." Salmo 40.1

sábado, 17 de abril de 2010

.cicatrizes

Passou mais um dia, um mês, um ano,
E tudo se repete.
Todos os dias, como que por um plano
Chega o Problema, indesejável e mundano
E deixa marcas da sua passagem, como lhe compete
A vontade é abrir a torneira e deixá-lo ir pelo cano
Quem sabe já percebeu, quem não sabe, que interprete.
Independentemente do que eu diga, faça ou pense
O Problema não desaparece, existe para atormentar
Ele engana-se, se acha que me convence
Numa batalha assim, só sobrevive o guerreiro que vence
Não há premio para o segundo lugar
Se dependesse de mim, isto acabava já.
Esperei demasiado, esperámos demasiado
Não podemos contar com os ‘talvez eu vá...’
Olhamos a volta e contamos com quem está.
E assim podemos transformar este presente em passado.
Tudo podia ter sido mais fácil, eu sei.
Dei voltas maiores para arranjar cicatrizes desnecessárias
Fiz um caminho mais difícil com decisões que tomei
Voltas e voltas por ‘atalhos’ sem lei
Que me fizeram perder tempo com opiniões contrárias
Hoje, por algum motivo, estou em paz.
Nada mudou, o Problema continua aqui, bem perto.
Há pessoas que eu devia ter conhecido há muito tempo atrás
Provavelmente por esta altura já não via o que o Problema faz
E já tinha parado de rastejar pelo deserto.
Continua a ser incrível a forma como fomos resgatados
Por algum motivo a novidade trouxe protecção
Em vez de nos apedrejar pelos nossos pecados
Fez-nos sentir protegidos e amados
Porque há um Amigo mais chegado que um irmão.


Glücklicher Geburtstag, Freund! Gott segnet Sie

sexta-feira, 19 de março de 2010

.casa sobre a rocha

Tudo o que eu pedia era um pouco de estabilidade.
Acolheria o primeiro abraço que me quisesse acolher
Guardava no coração os recantos da cidade
E deixava-os escapar, livres, em lágrimas de saudade
Desabafos, poesia de situações que nunca quis viver.
Hoje trago comigo um ‘eu’ prematuro
Obrigado a crescer depressa, num labirinto
Actualmente, num turbilhão de sentimentos que misturo
Eu tento estar à altura do desafio, juro!
Mas acabo a fugir à realidade, vivendo no quadro que eu própria pinto.
Fujo vez após vez àquele confronto ‘acidental’
Um dia começo a andar com um canivete
Sei que devo ser luz, sei que devo ser sal,
Mas aquela capacidade mórbida de ser pontual
Altera-me e destrói-me de cada vez que se repete.
Distribuo sorrisos na morada da tristeza
Encontro refúgio em propriedade alheia
Pai, tu és o meu refúgio e fortaleza
Tu és a minha força em tempo de fraqueza
Eu estava a construir uma casa sobre a areia
Construi sem planear
Um projecto sem estrutura
Hoje consigo estruturar
Não estou sozinha, sei quem me pode amparar
Não tenho medo, nem na noite mais escura.
Não faz sentido tocar uma música e alterar-lhe o andamento
Não faz sentido tentar iluminar uma cidade inteira com uma tocha
Por vezes temos que esperar pelo acalmar do vento
Por vezes é a dar voltas ao cruzamento
Que conseguimos construir a nossa casa sobre a rocha.


'Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha. E desceu a chuva, e correram os rios, e assopraram os ventos, e combateram aquela casa, e não caiu, porque estava edificada sobre a rocha. E aquele que ouve estas minhas palavras e não as cumpre, compará-lo-ei ao homem insentato, que edificou a sua casa sobre a areia. E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda.' Mateus 7.24-27

Dedicado.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

.dependente dEle

Porque é que quando já não estamos à espera, depois de perdermos toda a preparação, é que as coisas acontecem? Mentalizei-me, preparei-me, e afinal já não era para acontecer. Voltei ao estado normal de 'não vai acontecer', e aconteceu. Deus tem um sentido de humor fantástico. Não podemos ter nada como certo, nada como definitivo, porque queiramos ou não, gostemos ou não, a verdade é que nada depende de nós. Ainda tenho que me habituar a essa ideia.

sábado, 23 de janeiro de 2010

22-01-2010 22:00 o acidente

Foto: Joana Wagner

Sexta-feira, mau presságio, o dia foi duro.

Começou logo de manha com uma sessão formal de algo que por motivos que não vou explicar, não vou pormenorizar aqui. À tarde, responsabilidades que não estava pronta a assumir, com dificuldade acrescida, motivos e motivos que desequilibram todo o meu sofisticado sistema de sobrevivência.

Ao fim da tarde o dia ia finalmente começar a melhorar. Reunião de jovens na igreja, os jovens passariam a noite lá. Eu, por ter recital no dia seguinte, voltaria para casa à meia-noite. Um pequeno percalço, eles chegaram ao local combinado, entrámos na carrinha e arrancámos. A carrinha estava a fazer a volta do costume para ir buscar os jovens. Depois de Algés seguiu para Paço de Arcos, por fim Leceia e, com todos a bordo, a paragem seguinte seria a igreja.

Não foi da vontade de Deus que chegássemos à igreja naquela carrinha. O que vou contar a partir daqui passou-se a uma velocidade alucinante, tão alucinante que ainda não percebi bem como tudo aconteceu. Para ser franca, o único motivo que me faz estar a escrever este texto é a necessidade de organizar as ideias e perceber bem o que se passou, para parar de pensar no assunto. Estávamos numa estradinha sem iluminação no meio de nada algures entre Leceia e Carcavelos. A estrada tinha muitas curvas, pouca visibilidade e aproximámo-nos de uma subida. A carrinha é velha, só conseguiria fazer a subida se fosse com alguma velocidade logo de início. Fizemos a descida anterior de forma a ganhar velocidade para fazer a subida, mas a estrada antes da subida, na curva, estava molhada. A carrinha não conseguiu fazer a curva, derrapou, bateu contra um muro e foi parar largos metros à frente, em contra mão. No interior, nós íamos a conversar e rir, não nos apercebemos do perigo, só dois dos jovens perceberam que íamos ter um acidente. O embate foi totalmente inesperado, e como a carrinha não tem cintos de segurança atrás, defendemo-nos cada um como pôde. Éramos 10 pessoas dentro da carrinha, gente a mais, e isso protegeu-nos. Funcionámos quase como cintos de segurança uns para os outros. Quando a carrinha parou, começaram as perguntas:
- Estão todos bem?
- O que é que aconteceu?
- Nós podíamos ter morrido!
- Podemos sair daqui?
- Eu só quero sair daqui, chegar à igreja.

Estávamos preocupados por estarmos no meio da estrada em contra-mão e com pouca visibilidade, algum carro podia bater-nos. Tirando um dos líderes, que estava no local do embate e ficou com um pé magoado e alguns cortes na cara, ninguém estava ferido, um autêntico milagre. Um carro da policia estava a passar por ali, viu-nos e parou. Ficámos desde então protegidos contra outro embate, e assim mais seguros. Abriram a porta da carrinha, deixando-nos sair. Rapidamente chegou uma ambulância e o pai de um dos jovens, que começaram a tratar de tudo. O pai em questão levou os seis que estavam bem para a igreja, e os bombeiros levaram um jovem menor para o hospital S. Francisco Xavier, e eu mais outro jovem e o nosso líder para o hospital de Cascais. Graças a Deus, ninguém teve ferimentos de maior. Um inchaço aqui, uma nódoa negra ali, um corte ou outro, ficámos todos bem. A carrinha era velha, não tinha cintos, o nosso líder ficou com vestígios do muro no casaco, ele próprio bateu no muro, avançámos bastante antes de parar e o que houve foram quatro feridos ligeiros. A ajuda chegou quase imediatamente, apesar dos nervos e de sermos todos muito jovens, foi possível manter a cabeça fria, tudo isto serviu para nos unir mais enquanto grupo. Hoje encaramos a vida com outra atitude. Falando por mim, sinto-me grata a cada momento por tudo ter sido assim, porque estamos todos bem, por cada momento bom, cada dia em que acordo, tudo o que tenho e nem reparo, porque ‘só damos valor às coisas quando as perdemos.’ Agora, se vou viver com medo a partir de agora? Nem pensar! Isto fez-me acordar para a vida, aproveitar cada momento, viver tudo mais intensamente, fez-me perceber o que é realmente importante para mim, fez-me sentir protegida. Porque naquele momento, muitas ‘coincidências’ contribuíram para que nada de grave nos acontecesse. Hoje dou valor aos pormenores, às coisas simples da vida a que nos acomodamos e habituamos, esquecendo-nos de que há quem não tenha nem metade. Hoje sinto que nada me pode prejudicar, eu sabia que estava protegida, mas nunca tinha experimentado esta protecção de uma forma tão directa.
‘Que diremos pois a estas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós?’ Romanos 8.31

Dedicado às dez pessoas que iam na carrinha quando tivemos a nossa segunda oportunidade de viver realmente, marcar a diferença, não ser apenas mais uma pessoa normal, vivendo apenas mais um dia normal.

sábado, 16 de janeiro de 2010

.oásis

Sabes? Às vezes é simplesmente demais. Tudo o que repito para mim própria vezes sem conta porque ‘uma mentira dita muitas vezes torna-se verdade’ deixa de fazer sentido. Não, não está tudo bem. Não, eu não estou bem. E não, as coisas não vão ficar bem. Uma porta abre-se para um corredor com 1000 portas fechadas, e nada resulta. Nada é o que devia ser, nada vale a pena; nada é o que é, e o que é, nada é. Tudo é uma farsa; um foi o que não devia, o é o que sempre foi, restando assim o que será. E o que será não será o oásis sonhado, planeado, esperado. Antes, será o que foi, o que é, mantendo as aparências e mentiras do ‘um dia tudo será diferente.’ Mas porque não nos conformamos ao que é? Afinal, sempre foi. Porque não haveria de continuar a ser? ‘Quanto maior é a subida, maior será a queda.’ Então, porque não rastejar eternamente? Esta queda não é senão o duro aperceber de que nada mudará e os contos de fadas são mentira. Assim sendo… lutar para quê? Existir para quê? Se o ter não importa e o ser nada pode, o que fica? O que escrevo não faz sentido, mas nunca escrevi nada tão real. A realidade não faz sentido. E se um dia tudo for demais, tudo chegar ao limite? É o fim? Quem sabe… talvez chegue nessa altura o meu oásis.

sábado, 9 de janeiro de 2010

.abrigo

Há algum tempo que não escrevia,
À partida é um bom sinal.
Já em pequena superava com poesia
Cada provação que me abatia
Só escrevo quando estou mal.
Com 18 anos sinto-me caquética
Vivo a um ritmo alucinante
Sufocada por uma questão genética
Perco num desabafo a minha veia poética
Sou invadida por uma inquietação angustiante
e nada faz sentido.
Vivo sem realmente viver
Sonho sem realmente sonhar
Quando o inimigo toma o poder
Eu podia ser dona da razão, dona do saber
E não teria a capacidade para o derrotar.
O mais ridículo, o que mais me admira
É que fui em quem deu o poder ao inimigo
Eu acreditei em cada mentira
Eu desisti do sonho que perseguira
Eu sai do meu abrigo
e nada faz sentido.
Hoje, sem saber porquê, vivo um castigo
Algum tipo de punição
Vivo cada dia no meio do perigo
É preferível ter a vida de um mendigo
A ter tudo e perder-me na agressão.
A rua não é a minha casa
Mas atrevo-me a dizer... antes fosse!
Cada minuto com ele só me atrasa
É suposto mostrar-me calma, e por dentro estou em brasa
Transformei em pedra de sal o que outrora foi doce.
e nada faz sentido.

Nada faz sentido.
Tudo está controlado
e nada faz sentido.
O futuro, o presente e o passado
e nada faz sentido.
Acredito que tudo se vai resolver
Ou pelo menos finjo acreditar
Acredito que um dia vou perceber
Que um dia vou poder viver
Viver tudo o que até hoje só pude sonhar.
Acredito que um dia viverei num lar abençoado
Que um dia derrotarei o meu inimigo
Acredito que um dia poderei deixar o passado no passado
Acredito que um dia terei o meu futuro à tanto esperado
Acredito nisto, enquanto estiver no abrigo.
Porque se saio para o mundo real
Se ouso ultrapassar este muro
Vou acabar numa realidade imoral
Numa terra sem luz e sem sal
E pior, perco o meu único porto seguro.
e nada faz sentido.

'Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei! E aprendei de mim que sou manso e humilde de coração! Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve!' Jesus Cristo